O relator da Reforma Administrativa (PEC 32/2020) na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, deputado Darci de Matos (PSD/SC), defendeu ontem, em entrevista à Record News, redução de direitos de servidores e praticamente desenhou com as palavras a destruição do Estado pretendida com a aprovação da PEC.
“A partir do ano que vem, os prefeitos, governadores e o presidente da República só farão concurso para carreira típica de Estado. E o que é carreira típica de Estado? É o servidor que tem poder de polícia. (…) Para os demais servidores, eles terão um vínculo com a prefeitura, governo do estado ou a União chamado ‘vínculo por prazo indeterminado’ (…) Eles vão trabalhar 44 horas, não mais 40, não vão ter licença-prêmio, não vão ter triênios, não vão ter progressões automáticas e não vão ter a estabilidade do emprego”, afirmou o relator.
Desconhecimento
Pela entrevista, é muito preocupante que o relator de uma matéria tão importante mostre desconhecimento básico sobre ela. Matos disse que é preciso regulamentar o artigo 41 da Constituição, que trata da estabilidade dos servidores públicos, porque, segundo ele, “prefeitos e governadores hoje têm dificuldade em demitir quem não produz, quem não obedece, quem não cumpre obrigações”.
Para o presidente da Associação Nacional dos Especialistas em Políticas Públicas e Gestão Governamental (Anesp), Pedro Pontual, o problema colocado como exemplo pelo deputado é uma questão relativa à gestão de recursos humanos. “O fato de o deputado ter a ciência de que o Artigo 41, com a redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998, precisa ser regulamentado para que possa ser feita uma avaliação de desempenho adequada do servidor significa que ele também entende que não há necessidade de uma PEC para trazer novamente o assunto”, explica.
Pontual também enfatiza que a demissão do servidor por mau desempenho ou não cumprimento de função já existe e é aplicada. “Hoje é possível demitir quem não cumpre suas obrigações. Já é considerado desídio, abandono de emprego. A CGU demite servidor público todos os anos por essas razões. É inverídico dizer que a estabilidade é absoluta e protege o mau servidor”, afirma ele.
Para quem pensa em ingressar no serviço público, o relator deixa claro que a mudança será radical caso a PEC 32/2020 seja aprovada, e que só haverá concurso público para as carreiras típicas de estado, que o deputado classificou como “aquelas que têm poder de polícia”, embora o governo não tenha deixado isso claro na proposta.
Para Pedro, a avaliação do deputado é muito preocupante, porque mostra desconhecimento dele também em relação ao Poder Executivo. “Estando a garantia dos serviços públicos como direito do cidadão e dever do Estado na Constituição, inserir essas limitações de contratação é contraditório e inconstitucional”, afirma o presidente da Anesp.
Destruindo mitos
Darci de Matos disse que o serviço público é oneroso, ineficiente e corrupto, e que com sua digitalização e a modernização, já não será preciso tantos servidores. Quando questionado se o fim dos concursos públicos não iria aumentar o número de apadrinhados políticos, Matos respondeu que não “porque o Ministério Público, o Tribunal de Contas da União (TCU) e a imprensa vão fiscalizar a contratação de milhares de médicos, enfermeiros, professores, auxiliares e outros em todo o País”. “É preciso ter estudos de impacto para avaliar a economia que pode resultar da Reforma e esses números não foram apresentados até hoje pelo governo federal. A questão de reduzir a quantidade de servidores em função da modernização é uma questão de planejamento e gestão. Colocar isso na Constituição não tem sentido, porque você não pode fazer uma proibição genérica de uma situação de deve ser avaliada caso a caso”, argumenta Pontual.
O mesmo vale para o monitoramento sobre apadrinhamento de cargos. “Se você espera que o MP e o TCU façam mais trabalho, mas está reduzindo a força de trabalho que esses órgãos têm, é contraditório”, explica.
“Acabar com os concursos públicos e contar com essas mudanças todas faria sentido se a gente tivesse uma discussão prévia, como os países mais responsáveis para com os direitos da população fizeram. “Colocar ideias genéricas na Constituição, sem nenhum tipo de embasamento técnico, é muito perigoso, sobretudo no momento pelo qual passamos”, finaliza ele.
Com informações do “Que Estado Queremos?”
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